terça-feira, 8 de novembro de 2011

O IDH e o peso da história no Brasil

O relatório de Desenvolvimento Humano da ONU, divulgado no início do mês, mostra que o país está no caminho certo, mas tem ainda pela frente um desafio histórico a superar.

O Índice de Desenvolvimento Humano, medido com base no trabalho do economista indiano ganhador do Prêmio Nobel Amartya Sen, insere outros critérios, além do econômico, na avaliação da dinâmica histórica de 187 países. A análise não só contabiliza mudanças de renda nas populações, mas também de expectativa de vida e de escolaridade e a média de anos dedicados à educação.

Pois o IDH brasileiro subiu de 2010 para 2011 e, na verdade, vem subindo desde 1980. Era de 0,549, há 30 anos. Chega hoje a 0,718, em uma escala que vai até no máximo 1. O índice coloca o país em 84o lugar entre os 187 avaliados e no rol das nações com "alto desenvolvimento humano", abaixo daquelas classificadas como de "muito alto" desenvolvimento humano e acima das de desenvolvimento humano "médio" e "baixo". Pelo IDH, o Brasil está longe de ser uma Noruega ou Dinamarca, é pior que a Rússia e o Uruguai, mas melhor que a China e a África do Sul.

O problema para o país são os chamados "Indicadores complementares de desenvolvimento humano", que foram introduzidos no ano passado. Em todos eles o Brasil se sai muito mal.

O IDH Ajustado à Desigualdade (IDHAD), por exemplo, mede o quanto o desenvolvimento humano está distribuído entre a população. No Brasil, a diferença entre o IDH e o IDHAD é de 27,7% para baixo, situação melhor que a da Colômbia (33%) e da Namíbia (44%), mas pior que a da Coréia do Sul (17%) e da República Tcheca (5%). A parca distribuição de renda e as dificuldades no acesso à educação e à saúde no Brasil jogam para baixo o índice de desenvolvimento humano do país: de 0,718 para 0,519.

No indicador que leva em conta o gênero, o Índice de Desigualdade de Gênero (IDG), o país também não foi muito bem e ficou em 80o lugar entre 146 países. No que diz respeito ao Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), que indica a pobreza além da privação da renda e mede também problemas da população mais pobre no acesso aos sistemas de saúde e escolaridade, a avaliação novamente não é positiva. No caso brasileiro, o IPM é 1,1 ponto percentual pior que a pobreza de renda.

Os números, no entanto, não devem encobrir os avanços e o próprio Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) faz questão de ressaltar isso no texto de divulgação do relatório aqui no Brasil. A elevação de mais de 30% no índice entre 1980 e 2011 demonstra continuidade e se constitui de um aumento de 11 anos na expectativa de vida, de mais de 4 anos no tempo médio de escolaridade e de quase 40% na renda, como aferida pela instituição. O que, na verdade, fazem os índices complementares é contabilizar o peso da história nas avaliações.

Mesmo assim, isso não significa que tudo vai de vento em popa. A curva brasileira relativa à educação na avaliação do IDH (a mais clara, ao lado no gráfico) cruza em elevação intensa o ano 2000 mas perde inclinação em seguida, demonstrando uma diminuição no ritmo das melhorias. De fato, segundo o PNUD, a expectativa de anos dedicados à escolaridade para o brasileiro recém-nascido médio piorou de 14,1 anos, em 1980, para 13,8 anos, em 2011.

Ou seja, o relatório da ONU confirma o privilégio histórico que o país vem dando à renda, em relação à saúde e à educação. Apesar dos ganhos na expectativa de vida da população, o país ainda patina na provisão pública de bens considerados fundamentais à qualquer sociedade que pretende se considerar minimamente justa.

6 comentários:

  1. Olá Arthur, melhor artigo que li sobre os novos IDH. Mas acho curioso que a expectativa de vida suba quase linearmente, sempre. Isso deve mascarar ganhos "informais" de saúde e educação, ligados a melhoria tecnológia, que também barateia informação.

    Abraços, Eduardo

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  2. Eduardo, pensei a mesma coisa. É bem provável que a expectativa de vida já suba naturalmente em função da disseminação tecnológica e não necessariamente ligada de forma direta a avanços no terreno da saúde. Um abraço e muito obrigado pela leitura, Arthur

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  3. oi artur, engraçado, né: o brasil cresce e melhora, mas viv caindo pelas tabelas (a nao ser que sejam dos números absolutos, como PIB). eu comecei a comparar renda per capita e IDH na metad dos anos 90. o brasil era nr. 54 em renda per capita e entre 5 e 10 pontos mais abaixo no ranking do IDH. nas duas ultimas tabelas que eu salvei (de 2 ou 3 anos atrás, mais ou menos), o brasil tinha o ranking 65 e 70 em IDH. agora é 84. e eu me pergunto comé que pod ser, ja que o brasil dev ser dos poucos países ond a diferença entre ricos e pobres ta diminuindo (sempre anti-cíclico...).

    eu comparei a tabela ond o brasil ainda é nr. 65 com essa atual: o brasil foi ultrapassado por 6 países da europa oriental (incluindo o segundo país mais pobre da europa, a albania), por 7 da américa, dois da ásia, e mais 5 entraram na lista que nao tavam la: liechtenstein, andorra, palau, servia e montenegro. os três primeiros ja devem ter tido um IDH mais alto na época, os dois ultimos provavelment ultrapassaram o brasil nos últimos tempos (no meio dos anos 90 eu tinha lido que nas favelas de sao paulo só o terço mais pobre ganha 150 dolares, o que equivalia ao salário médio na iugoslávia). há 20 anos a renda per capita brasileira era mais alta que de qualquer país da europa oriental (com exceçao provavelment da slovenia), mas eles tinham e tem indicadores sociais muito melhores, claro. os mais ricos, como a rep. tcheca, hungria, polonia, e até a russia ultrapassaram o brasil em renda per capita (alguns pelo menos em part por causa do dinheiro da uniao europeia), e como ja tinham indicadores sociais melhores, claro que tem um IDH mais alto no momento. os mais pobres ainda nao ultrapassaram o brasil em renda per capita, mas ela subiu o suficient pra que junto com os melhores indicadores sociais dece pra ultrapassar o brasil. ja pra ultrapassagem de países latino-americanos e caribenhos eu nao tenho uma explicaçao. a única seria que nao é uma questao de tempo e sim da mudança de metodologia. cuanto mais fatores sociais, menos o fator econômico conta, e, claro, tradicionalment o brasil é um país relativament rico mas injusto. eu só nao sei se nao é exagerado cavocar tanto nos fatores sociais, afinal alfabetizaçao e expectativa media de vida SAO sem dúvida fatores sociais: se um país tem uma renda per capita alta porquê tem um milionário muito milionário, mas 99 pés rapados, a expectativa média de vida vai ser baixa – o rico nao vai poder viver 1000 anos pra compensar o fato de que os pé-rapados morrem com 40. e um milionário letrado e genial nao compensa o fato de 99 serem analfabetos.

    mas nao deixa de ser interessant: em renda per capita absoluta, o brasil ocupa o terceiro lugar na america latina, só perdendo pro chile e uruguai (e de acordo com algumas fontes pra venezuela). em renda per capita por poder de compra, o sétimo. e em IDH, o décimo primeiro (até atrás do peru, do ecuador...).

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  4. tiv que separar o meu texto, a técnica nao gosta de texto tao longo, ao que parece...

    o consolo: na verdad o brasil nao é numero 84 e sim 83, afinal botar hongkong como país na lista nao faz sentido – daí podem por campinas, sao caetano ou bento gonçalves como países independentes, eles vao tar la em cima. o outro consolo: o brasil ultrapassou ele mesmo um outro país! pena que foi só a colombia, que eu nem sabia que ja tinha tado na frent do brasil... e mais um consolo: muita gent acha que o brasil é o país mais injusto do mundo, mas a inglaterra tambem tem uma defasagem entre os rankings de renda per capita e IHD de 7 pontos negativos, como o brasil, e 44 países (mais ou menos 1/4 dos países) tem uma defasagem maior que o brasil – o segundo pior é o kuwait, com 57 pontos negativos, e o pior é a guiné ecuatorial, que tem renda per capita mais alta que a alemanha ou o japao (por causa do petróleo) e um IDH abaixo do stado mais pobre do brasil, o alagoas (91 pontos negativos). e last but not least: na ásia nós fomos ultrapassados pelo líbano e pela arábia saudita. que vergonha, hem, ser ultrapassado pela arábia saudita... mas ja que a gent ta querendo medir TUDO, porquê nao comparar também a cualidad visual, por exemplo das praias brasileiras com as da arabia saudita - tanto em termos de riqueza natural como carnal (acho que pouca gent prefere mulher completament coberta a uma mulher de tanga). e ond se come melhor, na suécia ou no brasil? e que tal comparar as temperaturas canadenses com as brasileiras?

    desculpe o comentario alongado. comecei a ler o artigo, daí comecei a ver as statisticas e nao consegui mais brecar. abrassus

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  5. Zedorock,

    Muito obrigado pela leitura e pelos comentários, sempre enriquecedores. Na verdade, a minha posição é de que, claro, os indicadores são falhos em muitos sentidos, mas nos ajudam a insistir na necessidade de se prestar mais atenção aos componentes sociais do desenvolvimento no Brasil.

    Grande abraço,
    Arthur

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  6. o brasil ocupava uma posiçao melhor a 30 anos, mas é que muitos países ainda nao tavam nas statisticas. eu calculei a porcentagem de países que tavam piores que o brasil em 1980, 1990, 2000 e 2011. em 1980 ele tava melhor que 49% dos países (ainda tava entre a metad de baixo), no momento ta melhor que 55%. eu suponho que seja o mérito dos últimos dois governos (e eu spero que o governo atual mantenha (se nao melhorar...) a performance.

    e depois se se levar em conta que a maioria dos países melhores que o brasil tem populaçao pequena e se levar a populaçao em consideraçao, o brasileiro médio tem um IDH mais alto que 80% da populaçao mundial.

    e pelo menos em relaçao a europa sem dúvida que o sistema social ta melhorando - bolsa familia, salario desemprego, etc. na alemanha eu nunca tiv que pagar por uma pont no dentista, agora eu tenho que pagar 3/4 dos custos, cerca de 1.500 euros, e tem um bocado de gent que nao tem ece dinheiro. tem gent ganhando 3 euros por ora, o que seria impensavel a 20 anos atrás.

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