segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Entre o desarmamento e o equilíbrio estratégico

Com sua peculiar noção de tempo, amplificada pela internet, a mídia jornalística se prepara para discutir no ano que vem, particularmente em outubro, os 50 anos da Crise dos Mísseis. O evento histórico, que por um fio não deu cabo à existência humana, põe em cheque o "equilíbrio estratégico" e reforça a necessidade de se discutir o desarmamento.

A Crise dos Mísseis elevou a tensão mundial durante a Guerra Fria de forma bastante perigosa. Talvez tenha sido, e para muitos autores foi, o momento mais perigoso do período, e, por isso mesmo, é importante entender as versões. A mais consagrada atualmente, que incorpora os documentos liberados após a mudança de regime, é a de que o presidente John Kennedy deu chances à linha dura em Moscou para que pressionasse por uma atitude mais forte da União Soviética frente à relativa agressividade do novo governo em Washington. Kennedy já na campanha levantara o tema do "missile gap", afirmando que os soviéticos haviam superado os Estados Unidos em capacidade balística e nuclear durante o governo Eisenhower, o que de modo algum era verdade.

Quando Kennedy assume, imediatamente inicia um amplo processo de renovação do poderio nuclear americano, em especial no setor naval e de submarinos. Também foi no começo da administração JFK, não se deve esquecer, a frustrada Invasão da Baía dos Porcos, em outubro de 1961.

É nesse contexto que estão o acidente do submarino nuclear K-19, em julho do mesmo ano e representado em filme recente com Harrison Ford: "K-19: The Widowmaker", bem como a Crise dos Mísseis Cubanos, de outubro de 1962, chamada em Cuba de "Crise do Caribe" e pelos russos de "Crise de Outubro". O evento histórico foi representado também em filme: "Treze dias", de Roger Donaldson.

A idéia do equilibrio da Guerra Fria é muito difundida na literatura das Relações Internacionais, em especial entre os realistas mais voltados para as questões estratégicas. Alguns analistas chegaram a afirmar, no início do período pós-Guerra Fria, que o "equilíbrio" poderia ser mantido garantindo-se a capacidade nuclear de um número pequeno de potências regionais, que manteriam a ordem em suas áreas de influência e não brigariam entre si com o risco de botar tudo a perder, ou seja, a existência do planeta. Não à toa, em um outro filme, The Peacemaker (O pacificador), de 1997, um general americano afirma em meio a um problema com ogivas nucleares roubadas do arsenal russo: "God, I miss the Cold War".

O relacionamento das duas grandes potências durante a Guerra Fria foi realmente respeitoso dos limites, onde descansam os riscos. Não há registros, oficiais pelo menos, de enfrentamento direto entre soldados soviéticos e americanos no período, por exemplo. No entanto, isso não significa que o pior não poderia ter acontecido.

Afinal, o ponto principal dessa discussão é o dilema ético e moral causado pela existência de tamanho poder de destruição submetido à decisão humana. Como certa vez afirmou Rabindranath Tagore: "If in his eagerness for power, a nation multiplies his weapons at the cost of his soul, then it is he who is in much greater danger than his enemies".

Além da questão ética, há também aquela que diz respeito à finalidade do recurso público, o problema da prioridade de alocação. Estimativas na Índia, por exemplo, afirmam que o custo do programa nuclear local poderia colocar todas as crianças indianas em escolas bem cuidadas e gratuitas, em um país onde o analfabetismo gira em torno dos 40%.

Hoje, claro, há mais "instabilidade". Os conflitos são dispersos e numerosos mas, pelo menos até agora, de pequenas proporções. O atentado de 11 de Setembro matou 3 mil pessoas. O Brasil teve mais de 40 mil mortes no trânsito em 2010. As necessárias limitações ao poder de destruição do homem e ao credo na capacidade da razão humana de fazer a coisa certa sustentam a importância das discussões em torno do desarmamento internacional, das grandes potências inclusive.

Para saber mais:
Kennedy
Uma visão de paz
Os melhores discursos
de John F. Kennedy
Robert Dallek e Terry Golway (org.)
Tradução: Bárbara Duarte
apresentação à edição brasileira
Jorge Zahar Editor


Veja o discurso de John Kennedy que decretou o bloqueio naval a Cuba, no canal:
You Tube
MultiPensamento

Nenhum comentário:

Postar um comentário