quarta-feira, 30 de abril de 2014

1st Joint Seminar PUC-Rio/Queen's University Belfast on Media and Representation

Encontro está confirmado para os dias 13, 14 e 15 de maio, no Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio.

Será realizado nos dias 13, 14 e 15 de maio, no Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, o Primeiro Seminário Conjunto PUC-Rio/Queen's University Belfast sobre Mídia e Representação (1st Joint Seminar PUC-Rio/Queen's University Belfast on Media and Representation).

O encontro terá transmissão ao vivo pelo Portal PUC-Rio e contará com a presença da professora  Andrea Mayr, Lecturer in Modern English Language and Linguistics, Erasmus Programme Director, School of English, Queen's University-Belfast; do professor Arthur Ituassu, professor-pesquisador em Comunicação e Política do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, pós-doutorando no Centro de Estudos Avançados em Democracia Digital, em Salvador (FACOM/UFBA); da professora Cláudia Pereira, doutora em Antropologia Cultural pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - IFCS / PPGSA, pesquisadora e professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUC-Rio, coordenadora do Curso de Publicidade e do PECC: Programa de Estudos em Comunicação e Consumo Academia Infoglobo/PUC-Rio; e da professora Adriana Braga, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUC-Rio, autora dos livros "Personas Eletrônicas: feminilidade e interação no blog Mothern" (Ed. Sulina, 2008) e "CMC, Identidades e Género: teoria e método" (Ed. UBI/Portugal, 2005),  vencedora dos prêmios The Harold Innis Award 2007 (MEA/EUA) e Prêmio CAPES de Tese 2007.

O seminário ocorrerá de 14h às 17h na sala 102K do Campus da PUC-Rio na Gávea, com tradução simultânea e entrega de certificado aos participantes. Veja a programação completa do encontro:

13/05, terça-feira, de 14h às 17h:
Media and Representation: Communication, Ethics and the Social World
Prof. Andrea Mayr (Queen’s University Belfast) and Prof. Arthur Ituassu (COM/PUC-Rio)

14/05, quarta-feira, de 14h às 17h:
Media and the Representation of Violence in Brazil and the UK
Prof. Andrea Mayr and Prof. Cláudia Pereira (COM/PUC-Rio)

15/05, quinta-feira, de 14h às 17h:
Methodologies for the Analysis of Media and Representation 
Prof. Andrea Mayr and Prof. Adriana Braga (COM/PUC-Rio)

Organização:
Professor Arthur Ituassu, Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio.

Promoção:
Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUC-Rio.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Na direção errada

Internet ultrapassa TV aberta no investimento de anunciantes nos Estados Unidos, mas versões online dos jornais não aproveitam o boom digital publicitário.

Relatório divulgado no início do mês (10/04/2014) pela organização Interactive Advertisement Bureau (IAB), que reúne mais de 600 empresas de mídia e tecnologia, mostra que, em 2013, o investimento em anúncios na internet ultrapassou pela primeira vez aquele feito na TV aberta nos Estados Unidos. Com um crescimento de 17% em relação a 2012, o valor gasto pelo mercado americano com anúncios no ambiente digital foi de US$ 42.8 bilhões, contra US$ 40.1 bilhões investidos na TV aberta.

O fenômeno confirma uma tendência de crescimento exponencial do investimento em anúncios na internet, que já havia ultrapassado em 2012, nos Estados Unidos, os recursos desse tipo alocados na mídia impressa (jornais + revistas). Como ressalta o especialista Ken Doctor, do Nieman Journalism Lab, o valor gasto com anúncios no ambiente digital é hoje mais que o dobro daquele direcionado à mídia impressa americana: US$ 42.8 bilhões contra US$ 18 bilhões.

O gráfico abaixo, produzido pela IAB, mostra o desenvolvimento histórico recente do investimento em anúncios por mídia nos Estados Unidos.




Como se vê no gráfico, entre 2005 e 2013, o investimento em anúncio dedicado aos jornais impressos caiu de mais de US$ 45 bilhões para menos de US$ 20 bilhões, enquanto aquele voltado para o ambiente digital cresceu de pouco mais de US$ 10 bilhões para quase US$ 50 bilhões. No entanto, além de verem reduzida de forma expressiva sua fatia no mercado anunciante, os jornais americanos não têm se beneficiado do boom digital publicitário recente nas suas versões online.

Segundo Ken Doctor, com base em um relatório de 2013 da Newspaper Association of America (NAA), os anúncios digitais em jornais somaram somente US$ 3.42 bilhões do total de US$ 37.59 bilhões de renda gerada pelos periódicos nos Estados Unidos no ano passado, com um percentual de crescimento de apenas 1.5% em relação a 2012. De fato, os números mostram que os jornais têm ficado somente com algo em torno de 8% de todo o gasto do mercado americano com anúncios digitais.

É claro que os dados relativos ao ambiente midiático nos Estados Unidos devem ser relativizados. Pesquisas recentes mostram que a televisão têm ainda uma influência muito forte no contexto brasileiro. No entanto, a se confirmar a tendência, percebe-se que há pela frente um outro grande desafio às empresas de jornalismo, além da competição do conteúdo produzido e compartilhado na internet, o de se tornarem atraentes ao investimento em publicidade no ambiente digital.

terça-feira, 15 de abril de 2014

Duas moquecas, quatro longnecks e a conta, com Rob Walker

Um almoço como teoria política.

R.B.J. (Rob) Walker é um dos principais teóricos políticos contemporâneos. Professor da Universidade de Victoria, no Canadá, escreveu Inside/Outside: International Relations as Political Theory, um clássico recentemente publicado no Brasil, e, há alguns anos, After the Globe, Before the World, ainda sem tradução para o português. Felizmente, ele vem à cidade uma ou duas vezes por ano, lecionar no Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio.

Nossa conversa começou com um assunto banal, os preços no Rio de Janeiro. "Do jeito que estão, não sei se consigo continuar vindo ao Rio", disse. "Tudo está pelo menos 30% mais caro que no ano passado".

Falamos também da chuva. Comentei que, aqui no Brasil, alguns políticos estariam aliviados dela ter chegado ao Sudeste, referindo-me ao problema da água em São Paulo e da energia no país. Nesse momento, foi inevitável lembrar que a disputa pela água no planeta promete tensões, em um futuro próximo.

Na verdade, entreveros desse tipo já ocorrem em Israel, por exemplo, em torno do Rio Jordão, e Walker receia que os Estados Unidos terão grande interesse nas reservas de água canadenses, apenas não maiores que as nossas e as da Rússia. Apesar de também possuírem reservas expressivas, os americanos são os maiores consumidores de água do mundo.

Da água para o óleo, Rob Walker contou que as areias betuminosas do Athabasca, de onde se extrai petróleo, permitiram que o estado de Alberta tomasse a frente da antiga disputa política no Canadá entre Quebec e Ontario, e o produto disso foi um governo do tipo direita-conservador-texano, que substituiu o antigo Canadá liberal. "Vocês não temem o que o pré-sal pode causar a vocês aqui no Rio?", indagou.

Como quem foge da reta, perguntei se ele tinha lido o texto que havia lhe enviado no início do ano, uma versão em inglês de um trabalho que será apresentado no fim de maio, em Belém, na 23a Compós. O paper trata do campo teórico da e-Representação, no ambiente acadêmico da e-Democracia. "Li, mas deixei as anotações em casa", confessou. "No entanto, eu lhe diria uma coisa: o "e" é somente 2% do problema".

Ao fim, segundo Walker, estamos todos inseridos nas linguagens que se referem a Maquiavel, Hobbes e Kant. Quando falamos do demos, pergunta, que demos é esse? Ainda estamos na Grécia e sua cidadania restrita, vivemos ainda a metafísica e o elitismo tecnocrático platônico. Quem realmente tem capacidade de participar, deliberar ou mesmo interpretar a massa de informações que se encontra hoje na Internet?

Da mesma forma, a que nos referimos quando dizemos "o cidadão"? A um "objeto" da política, como pensou Maquiavel em O príncipe? A um "sujeito" à política (subject), que autoriza o poder, como concebeu Thomas Hobbes em seu Leviatã? Ou à capacidade de pensar por si mesmo, as subjetividades de Imannuel Kant? De algum modo, weberianamente falando, pouco importa o "e" se as condições materiais da sociedade não se alteram. Pelo contrário, se reproduzem na própria ação humana.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Vem aí: oquefezseudeputado.com.br

No campo da E-Representação, projeto reunirá informações e análises sobre o que fez cada um dos 46 deputados federais do estado do Rio de Janeiro no Congresso Nacional no último mandato.

Uma ampla literatura chama a atenção hoje para alguns problemas presentes mais ou menos de forma generalizada nas democracias contemporâneas. Um resumo das questões normalmente apontadas poderia constar de fenômenos contemporâneos como a apatia do eleitor, a ausência de efetividade da cidadania no que tange aos negócios públicos, o descolamento entre o sistema político e o cidadão, o desinteresse na política, uma visão muito negativa da política e dos políticos, uma informação política de qualidade duvidosa, baixo capital político da esfera civil, ausência de soberania popular e desconfiança generalizada da sociedade com relação à política e ao político.

Nesse contexto, alguns autores chamam a atenção para a simultaneidade entre uma variedade inédita de oportunidades ao alcance do cidadão de acesso e questionamento das autoridades governamentais e um profundo sentimento de frustração e desapontamento com a capacidade do mesmo cidadão de fazer alguma diferença nas decisões políticas. Nesse sentido, algumas pesquisas apontam para um certo “desconforto compartilhado”, uma “crise de descolamento”, como um fenômeno generalizado que afeta, em diferentes graus, democracias novas e consolidadas.

Esse fenômeno, por exemplo, pode ser representado pelo distanciamento entre a classe civil e os partidos, os baixos índices de comparecimento eleitoral, ao menos onde o voto não é obrigatório, e no amplo antagonismo das populações com relação à política e aos políticos. Para alguns autores, ainda colaboram para o contexto de crise a personalização midiática da política sob a figura de lideranças plebiscitárias e as mudanças no mercado de trabalho – que tornaram mais complexas as grandes categorias populacionais. Ressalta-se assim um conjunto de transformações estruturais que vem sendo caracterizado pelo uso do vocábulo “crise”, crise dos partidos, da política, da democracia, da representação.

Fazem parte desse contexto mais amplo questionamentos específicos, relativos à prática da representação política nos regimes democráticos,  Nesse campo, a noção de crise se sustentaria em três conjuntos de evidências: o declínio do comparecimento eleitoral, o aumento da desconfiança em relação às instituições políticas e o esvaziamento dos partidos. Os dois primeiros pontos têm por base os índices de comparecimento eleitoral nos regimes democráticos e as pesquisas de confiança e satisfação do cidadão para com as instituições políticas. O terceiro conjunto de problemas aponta para os partidos políticos, onde a burocratização excessiva das estruturas internas, o estreitamento do leque de opções políticas (com a derrota dos projetos históricos da classe operária) e, em especial, as mudanças que a mídia eletrônica introduziu na disputa política – como a personificação excessiva do debate político, a dramatização da prática política, a redução da política a eventos e espetáculos midiáticos e a formação de um público crescentemente mais consumidor que cidadão – colaborariam para o esvaziamento da relação entre a sociedade civil e as agremiações políticas, instituições clássicas que cumprem, ou ao menos deveriam cumprir, papel importante na mediação da representação política nos regimes democráticos.

Afinal, além dos partidos, outro mediador consagrado em crise, ao menos de legitimidade, são os meios de comunicação, dado que a mídia é hoje o lugar fundamental da difusão de representações do mundo social, o principal instrumento de disseminação das visões de mundo e dos projetos políticos. A questão, assim, passa pelo grau de pluralidade dos discursos veiculados e pelos questionamentos em torno da representatividade das vozes presentes no discurso midiático. Se a diversidade social não está minimamente representada, há um problema para a democracia, e a existência se vê ameaçada pela ausência de voz na disputa pelas representações do mundo social.

Nesse contexto, a lógica comercial das mídias de massa se torna um empecilho, dado que a presença ou não do discurso nos meios é dependente, em geral, de outros critérios, de audiência ou particulares da empresa. Soma-se a isso a percepção de que as decisões sobre esses mesmos critérios são discutidas e tomadas em geral por um grupo restrito de pessoas, normalmente pertencentes a uma mesma categoria econômica, social e cultural específica.

Não à toa, os déficits de democracia são normalmente acompanhados dos déficits de comunicação pública e política presentes também na maior parte dos regimes democráticos contemporâneos. Constantemente, são levantados temas como a competição entre a política e o entretenimento pela atenção do cidadão no ambiente midiático, a reprodução constante pelo jornalismo de uma visão cínica da política, a redução da política a eventos e personalidades, os problemas políticos inerentes ao sistema few to many da comunicação de massa tradicional e a personificação da política favorecida pelo ambiente midiático-imagético. De modo geral, preocupa uma comunicação midiatizada que mais afasta e menos aproxima o cidadão da política, bem como a qualidade da deliberação política mediada pelos meios de comunicação de massa.

É nesse debate que se insere o projeto "O que fez seu deputado" (www.oquefezseudeputado.com.br), a primeira iniciativa digital do COMP: Grupo de Pesquisa em Comunicação, Internet e Política da PUC-Rio. Concebido com a intenção de contribuir para o potencial de renovação da comunicação política que a Internet oferece às democracias contemporâneas, "O que fez seu deputado" é um projeto de utilidade pública, voltado para o fortalecimento da cidadania e da democracia.

Leia mais em:
ITUASSU, A. Repolitizando a representação: Uma teoria para iniciativas digitais em prol dos processos político-representativos no Brasil. Compolítica, Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política, v.3, n.2, (2013).

quinta-feira, 3 de abril de 2014

50 anos depois

Arquivo de Segurança Nacional americano divulga documentos inéditos com a transcrição de conversas de Kennedy com assessores sobre o golpe militar no Brasil.

O Arquivo de Segurança Nacional americano (The National Security Archive, NSA) divulgou esta semana (02/04/2014), transcrições inéditas de conversas do presidente John F. Kennedy com assessores sobre o golpe militar no Brasil. O NSA fica na Universidade George Washington e já havia divulgado, por conta dos 40 anos do golpe, audio tapes do presidente Lyndon Johnson, sucessor de Kennedy, clamando que os Estados Unidos fariam "tudo que fosse possível" no apoio à queda de João Goulart.

Os documentos se juntam aos muitos já divulgados em Washington sobre ações e conversas de Kennedy, Johnson e seus respectivos assessores, incluindo o embaixador Lincoln Gordon e o coronel Vernon Walters, sobre a Operação Brother Sam, como foi chamado o plano de apoio dos EUA ao golpe no Brasil. Nesse contexto, entretanto, ainda faltam os registros das operações clandestinas da CIA, a Central de Inteligência Americana, para desestabilizar a Presidência João Goulart entre 1961 e 1964. Esses documentos, ainda secretos, seriam, segundo Peter Kornbluh, que dirige o Projeto de Documentação sobre o Brasil no NSA, a "caixa preta dessa história toda". Recentemente, Kornbluh entrou com um pedido ao governo Barack Obama para que libere esses arquivos.

Um fato interessante dos registros divulgados agora é perceber que a primeira gravação feita por Kennedy no Salão Oval da Casa Branca – o presidente inaugurou secretamente esta prática – aborda a situação no Brasil. "Acho que um trabalho importante que temos de fazer é fortalecer os militares", disse o embaixador Lincoln Gordon, em 30 de julho de 1962, para o presidente Kennedy e seu assessor Richard Goodwin. Gordon continuou, afirmando que os Estados Unidos deveriam "deixar claro, de modo discreto", que não seriam "necessariamente hostis a uma ação militar, se estiver claro que o motivo para tanto é a entrega do país aos...", "comunistas", completou Kennedy.

Durante o encontro, o presidente e seus assessores decidiram elevar os contatos com os militares brasileiros, trazendo para campo o coronel Vernon Walters, que se tornaria o principal agente secreto americano na preparação do golpe. "Nós bem que poderíamos desejar que eles [os militares brasileiros] assumissem no fim do ano", sugeriu Goodwin, na reunião de julho de 1962, "se eles forem capazes".

Os documentos confirmam a faceta agressiva de Kennedy já conhecida no meio acadêmico, mas talvez pouco reconhecida em ambientes mais leigos. JFK, na verdade, acendeu o pavio da Guerra Fria desde a campanha. Um exemplo clássico disso foi a forma como atacou o presidente Eisenhower, acusando-o de permitir que os soviéticos tivessem passado à frente dos Estados Unidos tanto na corrida armamentista quanto na espacial, e apenas na segunda isso era verdade.

Apesar de não ter sido o mentor do plano de retirada de Fidel Castro do poder e de não ter envolvido as Forças Armadas norte-americanas na invasão da Baía dos Porcos, JFK estava ciente do fato e deu luz verde à operação comandada pela CIA. Para muitos historiadores, a Crise dos Mísseis e o quase desastre ocorrido na viagem-teste apressada do primeiro submarino nuclear soviético, o K-19 (conhecido como o “fazedor de viúvas”, ou “Hiroshima”, pela Marinha russa, e cuja história foi transformada em filme com Harrison Ford), foram respostas da linha-dura no Kremlin à agressividade de Kennedy.

Na verdade, Eisenhower deixou a Kennedy uma vantagem significativa na corrida armamentista da Guerra Fria. Ainda assim, JFK, ao tomar posse, iniciou a produção de 1000 mísseis balísticos intercontinentais, além de 32 submarinos Polaris, com mais 656 mísseis. Moscou, no mesmo momento, não tinha um submarino sequer capaz de lançar mísseis balísticos até o K-19, que podia carregar apenas três. Na época, enquanto os soviéticos tinham 50 bombardeiros com capacidade de carregar ogivas nucleares, os americanos tinham mais de 500.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Conhecimento e cidadania

Instituto de pesquisa britânico produz relatório sobre o impacto de iniciativas pró-transparência no acesso à informação e nas demandas por prestação de contas.

O instituto de pesquisa GSDRC, sigla para Governance, Social Development, Humanitarian and Conflict, publicou em janeiro deste mês um relatório encomendado pelo governo britânico sobre o impacto de iniciativas em favor de mais transparência política no acesso do cidadão à informação e nas demandas da sociedade por prestação de contas. Segundo o texto, mais informação sobre os agentes políticos é algo sempre bem-vindo, mas não suficiente para produzir um cidadão mais informado ou demandas sociais mais amplas de accountability.

Para o estudo, feito com base na literatura mais recente sobre o tema, fatores que influenciam a relação entre mais e melhor informação disponível e o acesso do cidadão são: 1) a qualidade da informação disponível – much open and transparent data in name is in practice not accessible to citizens; 2) a capacidade do cidadão de interpretá-las, dependente dos níveis contextuais de acesso à tecnologia, educação, digital literacy e capital social – ou o poder de influência das redes que são estabelecidas entre os cidadãos na sociedade; 3) discriminação e desigualdades sociais, ou seja, o poder da transparência de promover inclusão e empoderamento pode ser diminuído frente às persistentes desigualdades que atuam contra o acesso à informação por grupos de alguma forma marginalizados ou em desvantagem social; 4) novas tecnologias de informação e comunicação, que apresentam o potencial de reduzir a distância entre os dados e o cidadão, mas que podem também criar novos processos de desigualdade com os déficits humanos e tecnológicos envolvidos em seu uso; e 5) o papel dos "infomediadores", como a mídia, desenvolvedores, organizações civis e internacionais, que atuam (positiva e/ou negativamente, a depender do caso) na aproximação entre o cidadão e a informação governamental ou política.

No mesmo sentido, fatores que influenciam o fortalecimento das demandas por prestação de contas a partir de iniciativas voltadas para a transparência dos processos políticos incluem, segundo o estudo: 1) no lado da oferta, o grau de democratização, vontade política e incentivos estruturais no que diz respeito aos provedores de informação e os agentes políticos, bem como os processos de transição, as oportunidades para reforma que surgem de crises políticas e econômicas e a divulgação ampla de casos de corrupção generalizada no sistema político; 2) no lado da demanda, a questão se a informação compartilhada propicia ou não um entendimento maior sobre o comportamento do governo e como sugerir ou defender mudanças, o engajamento dos cidadãos no desenho e na implementação de políticas de transparência, os "gatilhos contextuais" que favorecem mudanças de comportamento, a capacidade da sociedade civil de desempenhar seu papel nesses processos e a influência externa na promoção de normas globais de transparência e sua capacidade de influenciar os contextos nacionais; e 3) na interligação entre governo e sociedade, a qualidade dessa relação e o investimento na criação de novos espaços para a colaboração construtiva na disseminação, no entendimento e uso da informação para o fortalecimento dos processos de prestação de contas e responsividade.

Ao fim, fica claro que, como bem afirma o estudo do GSDRC, iniciativas em favor de mais transparência são bem-vindas mas não suficientes para se exaltar uma transformação dos sistemas políticos ou uma democratização maior do Estado e de seus processos. Para tanto, é preciso avaliar caso a caso e, em especial, relacionar a qualidade e/ou a natureza da informação tornada disponível com o contexto político e social no qual ela está inserida. O relatório, assim, é um ponto contra os que pensam, talvez ingenuamente, que as tecnologias de comunicação isoladas são capazes de transformar as sociedades e os regimes políticos para melhor, sem notar que, muitas vezes, é o uso da técnica que cria barreiras ou reforça aquelas já existentes.

quinta-feira, 20 de março de 2014

Os rumos da história

O que está por trás da polarização política na Venezuela.

O site FiveThirtyEight, editado pelo estatístico americano Nate Silver, famoso pelos prognósticos para o campeonato de baseball e as eleições presidenciais nos Estados Unidos, publicou agora em meados de março uma excelente análise de Dorothy Kronick sobre o que está por trás da excessiva polarização política na Venezuela. A autora é estudante de doutorado na Universidade Stanford.

A partir do diagnóstico de que são as classes média e alta que protestam hoje contra o presidente Nicolás Maduro, e não a classe mais baixa, a autora pergunta: se ambos os grupos sofrem com o atual racionamento de alimentos, altíssima inflação e um perigoso contexto de violência social, o que os divide em relação ao governo em Caracas? Para Kronick, a resposta está no fato de que detratores e defensores do atual governo venezuelano avaliam o chavismo de forma diferenciada. Enquanto aqueles pró-oposição comparam a situação atual da Venezuela com o desenvolvimento histórico recente de outras nações latino-americanas, partidários do regime bolivarista analisam o momento em relação ao passado pré-Hugo Chávez.

Nesse contexto, Kronick lembra que, após a bonança dos anos 1970, os choques do petróleo e as crises dos anos 1980 e 1990 geraram um "pesadelo econômico". Nesse sentido, em relação ao desastre anterior, a Venezuela demonstrou recuperação após a chegada do socialismo bolivariano. A renda subiu e a pobreza caiu, como mostram os gráficos 1 e 2 abaixo, com base em informações do Banco Mundial e do Banco Central venezuelano.

Gráfico 1


Gráfico 2

Não à toa aqueles que apóiam o governo temem o retorno dos tempos pré-Chávez. Quinze anos depois da revolução bolivariana, o slogan político governista "No volverán" se mantém forte para boa parte da população venezuelana. No entanto, mesmo o sucesso pode ser relativizado e aí surgem as bases para a discordância. Afinal, o preço do petróleo, que girava em torno de US$ 10 nos anos 1980 e 1990, explodiu na virada do século, como mostra o Gráfico 3 abaixo. Frente ao aumento impressionante do preço do principal produto venezuelano pergunta-se: foi o regime bolivariano tão bem sucedido assim?

Gráfico 3

Na comparação com o desenvolvimento de outros países da América Latina, a Venezuela não vem se saindo bem. Os gráficos 4, 5 e 6 mostram isso, no que diz respeito à média do crescimento do PIB per capita entre 1999 e 2012 (Gráfico 4), à inflação média anual no mesmo período (Gráfico 5) e à média anual de redução da mortalidade infantil no intervalo (Gráfico 6). As colunas em vermelho representam a posição venezuelana em meio a outras nações do continente.

Gráfico 4

Gráfico 5

Gráfico 6

Nesse contexto, para Dorothy Kronick, o que poderia ajudar os venezuelanos hoje seria algum tipo de aprendizado recíproco. Em especial, segundo a autora, sobre o que dizem os dados comparativos com o desenvolvimento histórico recente de outros países da região. Por um viés mais político, no entanto, pode-se dizer que os números são apenas uma parte de um impasse no qual estão presentes questionamentos legítimos sobre a capacidade da democracia liberal venezuelana de construir um ambiente com padrões mínimos de justiça social e a possibilidade do regime bolivarista de se constituir em um poder não só eficiente em termos de governância como realmente democrático e regido por padrões mínimos de igualdade cidadã em sua ação.

quinta-feira, 13 de março de 2014

Democracia e representação

Publicação brasileira dialoga com novas perspectivas sobre a prática representativa em regimes democráticos.

O professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UNB) Luis Felipe Miguel acaba de lançar, pela editora Unesp, o livro Democracia e representação: Territórios em disputa. A obra vem se juntar a uma série de novos trabalhos sobre o tema que, para alguns autores, acaba por constituir, junto com os movimentos populares mais recentes, uma retomada da discussão sobre a representação política nos regimes democráticos.

Afinal, uma ampla literatura ressalta hoje uma gama de fenômenos históricos e sociais recentes que teriam modificado as condições nas quais a representação política se desenvolveria nas democracias contemporâneas. Alguns autores, por exemplo, apontam para uma crise no "pensamento standard" da representação, que se limitaria a conceber a prática às formas eleitorais e a partir de uma base territorial específica - o Estado-nação. É ressaltado, por exemplo, nesse contexto, o surgimento de arenas decisórias transnacionais, onde proliferam atores e temas de natureza não-territorial que escapariam do alcance da "representação standard", com base no voto e circunscrita ao Estado. 

Além disso, a literatura chama a atenção para o fato de que temas e arenas decisórias coletivas, nos níveis nacional e supranacional, estão hoje sob controle de especialistas, que percorrem caminhos distantes das tradicionais instituições da representação em regimes democráticos. Soma-se a tudo isso a relativização do caráter igualitário da democracia representativa moderna por demandas de reconhecimento, equalização ou compensação de grupos estabelecidos em torno de características, identidades ou condições sociais e/ou culturais. Tais demandas estariam produzindo um discurso de representação com base em lógicas diferentes daquelas ligadas ao igualitarismo e universalismo do “modelo standard” eleitoral e territorial.

São apontadas, assim, novas estruturas e oportunidades para a representação e a influência política, que não apenas refletiriam em parte um papel diminuído das estruturas formais nos processos decisórios, mas se constituiriam de uma crescente diversificação das formas público-discursivas e de associação nas sociedades contemporâneas.

Em meio a toda essa discussão, não à toa surgem também questões sobre a legitimidade e o caráter democrático das representações de tipo não-eleitoral e não-territorial, ou mesmo das chamadas “invocações ou reivindicações de representação”, que estão presentes na teoria mais recente sobre o tema. Nesse contexto, a literatura alerta para a diluição das certezas sobre “quem 'fala', por quem e com que autoridade”. Uma pesquisa feita em São Paulo e na Cidade do México afirma, por exemplo, que o ceticismo frente ao crescente protagonismo das organizações civis como agentes de intermediação política se mostra pertinente.

Inserido nesse debate, o livro de Luis Felipe Miguel ressalta a necessidade de se reforçar os mecanismos de controle e acompanhamento por parte do cidadão da prática representativa e desconfia das novas formas de pensar a representação política nas democracias contemporâneas, apresentadas pela literatura mais recente. Segundo o autor, como está na quarta capa de sua obra, "representação e democracia são 'territórios em disputa' porque tanto podem se concretizar em arranjos que favorecem a perpetuação das assimetrias e das relações de dominação quanto podem ampliar o custo de sua reprodução e, assim, contribuir para combatê-las". Nesse contexto, continua, a "teoria política não é um lugar neutro; ao contrário, é partícipe desta disputa, sem que isso signifique engajamento cego, redução da complexidade do real ou abandono do rigor na produção do argumento".

Ao fim, a meu ver, mais importante que as questões intrínsecas ao debate é perceber o quanto a discussão sobre a representação democrática, ora pensada a partir de uma “crise de representação” ou “crise da democracia representativa”, ora concebida através da necessidade de se reconfigurar os processos representativos a novas condições, tornou-se mais denso nos últimos anos, com a presença de uma multiplicidade de perspectivas e teorias normativas, pós-modernas, dos campos da comunicação política, da sociedade civil, das relações internacionais e da própria teoria democrática. Uma literatura que carrega o potencial de gerar reflexões sobre os processos que constituem a representação nas democracias contemporâneas, reafirmando dessa forma a própria posição da representação na teoria da democracia.

Para saber mais:
- CASTIGLIONE, D.; WARREN, M.E. Rethinking Democratic Representation: Eight Theoretical Issues. Texto apresentado no seminário Rethinking Democratic Representation, Centre for the Studies of Democratic Institutions, University of British Columbia, 18-19 de maio de 2006.
- LAVALLE, A.G.; HOUTZAGER, P.; CASTELLO, G. Democracia, pluralização da representação e sociedade civil. Lua Nova, n. 67, 2006, p. 49-103.
- MANSBRIDGE, J. Representation Revisited. Democracy & Society, vol. 2, n. 1, 2004, p. 1, 14-19.
- MANSBRIDGE, J. Rethinking Representation. American Political Science Review, vol. 97, n. 4, Novembro, 2003, p. 515-528.
- NÄSTRÖM, S. Where is the representative turn going? European Journal of Political Theory, vol. 10, n. 4, 2011, p. 501-510.
- REHFELD, A. Representation Rethought: On Trustees, Delegates, and Gyroscopes in the Study of Political Representation and Democracy. American Political Science Review, vol. 103, n. 2, Maio, 2009, p. 214-230.
- SAWARD, M. The Representative Claim. Nova York: Oxford University Press, 2010.
- SHAPIRO, I.; STOKES, S.C.; WOOD, E.J.; KIRSHNER, A.S. (eds.). Political Representation. Nova York: Cambridge University Press, 2009.
- VIEIRA, M.B.; RUNCIMAN, D. Representation. Londres: Polity Press, 2008.
- URBINATI, N. O que torna a representação democrática? Lua Nova, n. 67, 2006, pp. 191-228.
- URBINATI, N. Representative Democracy: Principles and Genealogy. Chicago e Londres: University of Chicago Press, 2008.

sexta-feira, 7 de março de 2014

A crise na Venezuela

Imbróglio pressiona instituições e ameaça estabilidade política na região.

Em meio ao acirramento da situação na Venezuela, o instituto Wilson Center, em Washington, convidou quatro especialistas para debater qual deve ser o papel de institutições internacionais e nações como o Brasil ou os Estados Unidos na crise venezuelana. Foram chamados para a discussão "The Crisis in Venezuela: What Role for the International Community": o diretor do Departamento de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade Di Tella, em Buenos Aires, Juan Tokatlian; o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza; o ex-diplomata americano Philip French; e o analista brasileiro Paulo Sotero, diretor do Brazil Institute, no Wilson Center. Os quatro, em geral, buscam diagnósticos e soluções para a sobrevivência das institutições venezuelanas em meio à polarização que, radicalizada, pode gerar efeitos políticos a todo o continente.

Para Tokatlian, a principal preocupação da comunidade internacional hoje com relação à Venezuela deve ser a prevenção de qualquer forma de autoritarismo de esquerda ou direita no país. Segundo ele, a radicalização do contexto venezuelano pode produzir caos social ou mesmo uma guerra civil, transformando-se em um foco de instabilidade com grande potencial de polarizar as políticas internas dos países da região – no caso brasileiro, um elemento a mais no já conturbado momento de Copa do Mundo, eleições e manifestações pelo país.

Ainda segundo Tokatlian, não há no continente uma instituição internacional com legitimidade para mediar os conflitos políticos na Venezuela, seja a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), da qual Estados Unidos e Canadá não fazem parte, a Organização dos Estados Americanos (OEA), da qual Cuba não faz parte, ou a União das Nações Sul Americanas (Unasul), que é vista pela oposição venezuelana como pró-chavista.

Dessa forma, para o professor, uma saída seria a promoção de negociações por um grupo formado por Estados Unidos, México, Colômbia, Brasil, Argentina, Bolívia e Cuba. No entanto, o próprio analista desacredita a viabilidade da reunião de um espectro tão divergente de nações.

O secretário-geral da OEA, o chileno José Miguel Insulza, faz um pronunciamento político. Prega a necessidade do diálogo e condena a violência como estratégia. Em seu texto, o ponto principal talvez seja afirmar que a Venezuela tem "um governo eleito democraticamente, com um significativo e visível apoio popular". Apesar da divisão, argumenta Insulza, "tais são fatos indisputáveis". Além disso, o secretário-geral demonstra não acreditar que a crise possa ser resolvida com intervenção externa: "The crisis will not be resolved from the outside", afirma.

O ex-diplomata americano Philip French também lembrou que "muitos venezuelanos apoiam o presidente Nicolás Maduro". Afinal, escreve o analista, foram a corrupção e uma maioria pobre e ignorada pela elite tradicional venezuelana durante décadas que levaram Chávez ao poder 15 anos atrás. Segundo French, os governos Chávez e Maduro desperdiçam há anos, de forma flagrante e até "criminosa", um capital político sem precedentes na Venezuela e os enormes recursos advindos da exploração de petróleo no país. Entretanto, apesar da inflação recorde, da insegurança e da escassez de produtos, algo em torno de metade dos venezuelanos apoiam o governo atual, a julgar pelas pesquisas e os resultados das eleições municipais e estaduais de dezembro de 2013.

Nesse contexto, segundo French, os Estados Unidos devem continuar a condenar a violência e os abusos aos direitos humanos na Venezuela e pressionar aqueles que têm feito vista grossa ao que acontece em Caracas, "como o Brasil e a OEA", afirma. No entanto, o ex-diplomata americano argumenta que qualquer retórica ou ação de Washington na crise venezuelana deve reconhecer o ressentimento legítimo das massas por trás de Hugo Chávez e Nicolás Maduro em relação às elites no país. Para French, qualquer que seja o próximo governo venezuelano, este terá que respeitar igualmente as aspirações chavistas e da oposição.

Por fim, o analista brasileiro Paulo Sotero lembrou das atuações passadas de Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva em crises na região, que poderiam servir de inspiração a Dilma Rousseff em como tratar do imbróglio vizinho. Em 2002, no último ano do segundo mandato, FHC denunciou a tentativa de golpe contra o então presidente Hugo Chávez como uma violação da cláusula democrática inter-americana, assinada em Lima em 11 de setembro de 2001.

No início de 2003, Lula liderou a criação do "Grupo de Amigos" da Venezuela e, em 2008, o então presidente agiu decisivamente para apaziguar uma crise interna na Bolívia, minando a estratégia de confrontação levada à frente por Hugo Chávez. Para Paulo Sotero, a atual crise venezuelana requer do Brasil a articulação de uma resposta coletiva no âmbito da Unasul.

Ao fundo das quatro posições está o alerta de que é preciso manter de pé as instituições políticas venezuelanas. Uma opção nesse sentido que vem sendo levantada, como bem lembra Sotero, é a proposta pelo governador do estado de Miranda Henrique Capriles. Derrotado por pouco nas presidenciais do ano passado, Capriles aposta no recall eleitoral de meio de mandato, previsto pela Constituição venezuelana.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Grã-Bretanha discute voto obrigatório

Ao contrário do que ocorre no Brasil, britânicos questionam voto facultativo.

A organização britânica Institute for Public Policy Research publicou este mês um artigo de três dos seus pesquisadores em defesa do voto obrigatório na Grã-Bretanha. Na verdade, como a reação à ideia de tornar compulsório o comparecimento às urnas é muito forte por lá – em geral os britânicos acham que obrigar o cidadão a votar é uma medida não democrática –, os autores optaram por fazer o que chamam de uma proposta "mais realista", ou seja, a de tornar o voto obrigatório somente para os jovens no primeiro pleito em que estiverem aptos a participar. Na Grã-Bretanha, a idade mínima para votar é 18 anos, mas os britânicos também estudam reduzí-la para 16 anos.

A ideia, que segue na contramão do que se debate no Brasil, tem por base não somente o fato de que o comparecimento às urnas tem decrescido na Grã-Bretanha, como em boa parte das democracias tradicionais que não utilizam o voto obrigatório, mas do crescimento exponencial do que o IPPR chama de "desigualdade no comparecimento". Como afirma um estudo publicado pela instituição no fim do ano passado, a participação eleitoral tem caído de forma drástica na Grã-Bretanha entre os jovens e os mais pobres.

Segundo a pesquisa, a diferença no comparecimento em 1987 entre o grupo mais rico e o mais pobre na Grã-Bretanha era de 4 pontos percentuais. Em 2010, essa diferença foi de 23 pontos percentuais. No que diz respeito à faixa etária dos eleitores, apenas 44% daqueles entre 18 e 24 anos votaram em 2010, enquanto 76% daqueles acima de 65 anos compareceram no mesmo pleito. O estudo do IPPR mostra que essa diferença, de 32 pontos percentuais em 2010, era de 18 pontos percentuais em 1970.

Para os pesquisadores, o problema da "desigualdade no comparecimento" é que ela reduz os incentivos para que os governantes respondam aos interesses daqueles que não votam, ameaçando um tema central da democracia, ou seja, o igualitarismo político eleitoral e sua capacidade de nulificar as diferenças de renda, status, conhecimento, educação ou qualquer outra distinção que ocorra entre os cidadãos na condução da política.

Nesse contexto, a ideia de promover algum tipo de comparecimento obrigatório tem a intenção de quebrar um ciclo vicioso. Afinal, a desigualdade no comparecimento tem levado os partidos britânicos a focar sua comunicação nos grupos mais dispostos a votar, que acabam por ter mais chance de ver seus interesses atendidos do que aqueles que não comparecem. Os ausentes, por sua vez, têm reforçado seu descontentamento com a política porque não veem suas vontades contempladas pela representação, o que gera mais insatisfação e reforça o desejo de não participar.

No Brasil, o comparecimento dos jovens às urnas também têm decrescido, já que o voto é opcional para aqueles entre 16 e 18 anos. Se eles foram 4% do eleitorado no pleito presidencial de 1989, em 1998 o índice foi de 1,78%. Em 2010, mesmo depois de intensa campanha do governo federal para que os mais jovens votassem, os eleitores dessa faixa etária contabilizaram somente 2,51% do eleitorado.

Na verdade, alguns estudos sugerem que a obrigatoriedade eleva em até 50 pontos percentuais o comparecimento eleitoral nos países que fazem tal opção. Sobre esse ponto, uma referência clássica é o caso da Venezuela, que modificou sua legislação em 1993, eliminando as penalidades aos faltosos. Após a mudança, a média de 90% caiu para níveis próximos a 60% de comparecimento.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Jornalismo e democracia no Brasil

Morte de repórter-cinematográfico em manifestação joga luz sobre o papel da imprensa no regime democrático brasileiro.

A morte do repórter-cinematográfico Santiago Idílio de Andrade, da Rede Bandeirantes, na segunda-feira (10/02/2014), provocou uma avalanche de editoriais na grande mídia brasileira em defesa da liberdade de imprensa no país e da importância do jornalismo para o ambiente democrático no Brasil. Em editorial veiculado na edição do mesmo dia da morte de Santiago, o Jornal Nacional, por exemplo, afirmou que "é essencial, numa democracia, um jornalismo profissional, que busque sempre a isenção e a correção para informar o cidadão do que está acontecendo. E o cidadão, informado de maneira ampla e plural, escolha o caminho que quer seguir". O texto termina afirmando: "Sem cidadãos informados não há democracia".

No dia seguinte, editorial do jornal O Globo argumentou: "Se grupos radicais buscavam um cadáver nas manifestações de rua, conseguiram. Mas não foi o que poderiam imaginar. Em vez de jogar mais combustível na ferocidade do vandalismo em cima do corpo de um manifestante, mataram um repórter-cinegrafista no exercício de uma atividade essencial para a democracia, relatar os fatos para a sociedade". Ao fim, diz o periódico, "Atingiram a própria democracia, que tanto desprezam".

Também no dia 11, a Folha afirmou em editorial: "Identificar, julgar e punir autor e cúmplices do disparo que matou Andrade é tarefa urgente para evitar danos ainda mais graves. Com desenvoltura incontida, esses delinquentes têm transformado atos pacíficos em campos de batalha, ameaçando a segurança de quem está por perto e minando importantes pilares da democracia.  Um deles é a própria legitimidade das manifestações. (...) O outro é a liberdade de imprensa".

A relação entre jornalismo e democracia é um tema tradicional no campo da Comunicação e Política, e a imprensa é em geral tida como uma das mais importantes instituições que sustentam os regimes democráticos. O jornalismo fiscaliza políticos e governos, informa o cidadão, cobra, denuncia e debate temas da política ou comuns à sociedade. Na verdade, a política acaba sendo nos Estados modernos – se não em sua totalidade, ao menos em sua boa parte – o que se chama de "realidade mediada", ou seja, o cidadão tem contato com a política basicamente por meio do jornalismo midiatizado, que assume papel fundamental no desenvolvimento das democracias.

Apesar disso, a relação entre jornalismo e democracia não é, nem poderia ser, algo pronto, estabelecido, que não possa ser problematizado. Ou seja, o fato de haver imprensa livre e democracia não implica uma relação 100% benéfica para o regime democrático ou a sociedade. Na verdade, trata-se de um objeto complexo, para onde se deslocam inúmeras pesquisas e discussões. Se é verdade que, na democracia, uma imprensa é melhor que nenhuma imprensa, isso não significa que a relação entre jornalismo e democracia seja positiva em todos os seus aspectos, momentos e/ou configurações.

Nesse sentido, se a morte de Santiago de Andrade despertou argumentos adormecidos sobre a importância da imprensa, o fato também parece estar servindo menos à reflexão e mais à reprodução de lógicas um tanto defasadas que tentam legitimar na marra a representatividade da grande imprensa no regime democrático brasileiro.

Afinal, quando o Jornal Nacional afirma que é "essencial, numa democracia, um jornalismo profissional, que busque sempre a isenção e a correção para informar o cidadão do que está acontecendo. E o cidadão, informado de maneira ampla e plural, escolha o caminho que quer seguir", pode-se lembrar, por exemplo, que a relação entre jornalismo e democracia no Brasil sofre com uma configuração excessivamente concentrada, adquirida em tempos pré-democráticos e com base em um relacionamento histórico e duradouro da empresa beneficiada com um regime não-democrático. Além disso, que tal relação pena com o fato de que a mesma empresa se coloca, com legitimidade questionável, na função de representante público do cidadão brasileiro, tendo por base um discurso legitimador calcado em noções sobre isenção, neutralidade e profissionalismo jornalístico que não se sustentam, sejam atacadas pela história ou por simples questionamento epistemológico.

Perguntas semelhantes podem ser feitas quando O Globo afirma que "mataram um repórter-manifestante no exercício de uma atividade essencial para a democracia, relatar os fatos para a sociedade". Ora, quando é mais que notório que nem O Globo nem qualquer outro órgão de imprensa apenas "relata" os fatos para a sociedade, onde estão as bases para a legitimidade da imprensa e seu papel representativo do cidadão no ambiente democrático?

Dessa forma, se a morte de Santiago de Andrade tirou a poeira do debate sobre jornalismo e democracia no Brasil, homenagem maior o jornalismo brasileiro faria ao cinegrafista se aproveitasse a ocasião para refletir sobre os problemas fundamentais que envolvem a relação no país, como a concentração excessiva da estrutura midiática, a baixa remuneração dos profissionais nas redações, o uso intensivo de mão-de-obra ainda em formação e/ou de pouca experiência, a fraquíssima formação intelectual do jornalista em geral, o uso político das concessões de comunicação midiática, o preconceito do jornalismo com a universidade e o pensamento acadêmico, a espetacularização/novelização da notícia e da política, a baixa representatividade social nos debates midiatizados, a superficialidade excessiva da produção jornalística, a ênfase desmedida no entretenimento etc.

Nesse contexto, a reprodução desenfreada de lógicas defasadas e discursos questionáveis de legitimidade podem apenas alimentar a tragédia. Como escreveu a Folha, com base em um relatório da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji): "A morte de Santiago Andrade é, por óbvio, o episódio mais lamentável, mas, considerando a ação policial e a de manifestantes, foram registrados, desde junho, inaceitáveis 117 casos de agressão, hostilidade ou detenção de jornalistas".

sábado, 8 de fevereiro de 2014

O nome da alternância em 2014

Eduardo Campos é mais forte pelo simples fato de estar à esquerda de Aécio.

Em outubro de 2010, às vésperas do segundo turno das últimas eleições presidenciais, esta coluna deu seu apoio ao candidato José Serra, em nome dos benefícios da alternância de poder para o país. Na época, escrevi que as vantagens produzidas pela alternância no Brasil recente eram claras.

"Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva fizeram ambos governos com altos e baixos mas que em geral foram muito positivos para o país e se complementaram. O primeiro teve um papel histórico na estabilidade econômica e ainda conseguiu avanços significativos nos campos importantíssimos da educação básica e da saúde pública. O segundo soube manter os pontos positivos do programa econômico anterior e ainda reforçou políticas públicas importantes de distribuição de renda e geração formal de emprego. A alternância de poder traz mudanças nas prioridades de governo que acabam gerando benefícios para a sociedade de forma mais geral. Além disso, mantém fortes a oposição e o controle sobre o poder e impede que qualquer partido ou governo se sinta na posse do Estado".

Pois, em 2014, tudo indica que o nome da alternância é o candidato do Partido Socialista Brasileiro (PSB) Eduardo Campos, pelo simples fato de que Campos está à esquerda de Aécio. Em uma repetição do segundo turno entre PT e PSDB, eleitores do PSB e da Rede, de Marina Silva, até agora engajada na campanha socialista, tendem a votar novamente no PT, diminuindo as chances dos tucanos.

Na verdade, mesmo que um eventual apoio de Campos a Aécio no segundo turno possa reduzir o estrago, dificilmente fará os eleitores de Marina Silva votarem no PSDB. É difícil, inclusive, não acreditar que um dos motivos das derrotas seguidas dos tucanos no segundo turno é que eles foram jogados para a direita pelo PT e o discurso paulista conservador de José Serra e Geraldo Alckmin, em contraposição ao humanismo liberal de Fernando Henrique Cardoso e o progressivismo de Mario Covas e seu "choque de capitalismo", que o PSDB, em seu site, transformou erroneamente em "choque do capitalismo".

Nesse sentido, a posição de Campos à esquerda de Aécio o torna mais aglutinador, numa tortuosa aliança com Marina Silva. Se Marina tende novamente a não apoiar o PSDB no segundo turno – será o senador mineiro capaz de dobrar a militante ecológica evangélica do Norte? –, Campos pode aglutinar tucanos e marinistas no embate contra a presidente.

Ao mesmo tempo, quase 12 anos como o maior partido da oposição parecem não ter sido suficientes para o PSDB consolidar um discurso e se apresentar como uma opção verdadeiramente diferenciada à sociedade brasileira. Em vez de defender seu progressivismo liberal e atacar as mazelas perenes da oferta de serviços públicos básicos à população – ao fim, foram precisos centenas de milhares de brasileiros nas ruas para que esses temas realmente viessem à tona –, o partido manteve-se em geral preso, às vezes sem muita legitimidade, às agendas econômicas e morais da política nacional.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

1st Joint Seminar PUC-Rio/Queen's University Belfast on Media and Representation

Será realizado de 5 a 8 de maio no Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio o 1st Joint Seminar PUC-Rio/Queen's University Belfast on Media and Representation, com a participação dos professores Andrea Mayr, Lecturer in Modern English Language and Linguistics, Erasmus Programme Director, School of English, Queen's University-Belfast, e Arthur Ituassu, professor-pesquisador em Comunicação e Política do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, pós-doutorando no Centro de Estudos Avançados em Democracia Digital, em Salvador (FACOM/UFBA). O Seminário ocorrerá em quatro sessões, todas em inglês, e serão concedidos certificados aos participantes. As inscrições estarão abertas a partir do início de abril para estudantes de pós-graduação, professores e pesquisadores de Comunicação Social e áreas afins.

Sessão 1. 05/05 9h
Media and Representation: Communication, Ethics and the Social World
Prof. Andrea Mayr and Prof. Arthur Ituassu

Sessão 2 06/05 9h
Media and the Representation of Violence in Brazil and the UK
Prof. Andrea Mayr

Sessão 3 07/05 9h
Methodologies for the Analysis of Media and Representation
Prof. Andrea Mayr and Prof. Arthur Ituassu

Sessão 4 08/05 9h
Media, Representation and Politics
Prof. Arthur Ituassu

sábado, 4 de janeiro de 2014

O jornalismo na era das subjetividades (Dossiê)

O Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, por intermédio da Coordenação do Curso de Jornalismo, realizou nos dias 19, 20 e 21 de março de 2013 o seminário: “O jornalismo na era das subjetividades: reflexões sobre a prática na sociedade da informação”. A intenção dos três dias de encontro foi refletir sobre a dinâmica jornalística em dois contextos específicos, de crise da objetividade e de avanço das novas tecnologias de comunicação e informação. Ao todo, foram realizadas seis sessões de debates que se encontram aqui resumidas neste dossiê, publicado pela Revista Alceu, do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, no fim do ano passado.

Seis trabalhos compõem o dossiê. O primeiro deles, da professora Carla Rodrigues (COM/PUC-Rio), analisa os efeitos do modo de produção pós-industrial na prática jornalística. O professor Edgar Lyra (FIL/PUC-Rio), por outro viés, ataca o problema da objetividade e sugere um retorno a uma certa retórica aristotélica, como uma possível saída para o contexto de crise narrativa. O professor Leonel Aguiar (COM/PUC-Rio) trata da formação do jornalista nos contextos explicitados, enquanto este organizador, Arthur Ituassu, procura fazer uma reflexão sobre a importância ética do jornalismo na construção social da realidade. Por fim, Paulo Roberto Pires (COM/UFRJ) e Arthur Dapieve (COM/PUC-Rio) discutem as relações entre o jornalismo e a cultura em tempos de internet e subjetividades. O primeiro discute a "desintelectualização" das redações, enquanto o segundo chama a atenção para os problemas relativos à "desprofissionalização" da crítica cultural.

Ao fim, a esperança é uma apenas, a de que este dossiê consiga dar seguimento aos ricos e intensos debates desenvolvidos naqueles três dias de março de 2013.