quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Europeus lançam campanha em prol do pluralismo midiático

Mais de cem organizações civis participam do movimento contra a concentração e o controle político da mídia na Europa.

Com o intuito de apresentar uma legislação própria no Parlamento Europeu, a Iniciativa Europeia para o Pluralismo Midiático iniciou este mês de novembro uma campanha pública em prol de uma nova regulação da mídia no continente. O objetivo é buscar um milhão de assinaturas em apoio a suas propostas, número mínimo necessário para propor uma lei deste tipo na União Europeia (UE).

De acordo com o movimento, a liberdade e o pluralismo midiáticos estão hoje em crise na UE. Em alguns países, como a Hungria, os problemas são a excessiva interferência e o controle direto do aparelho político sobre a mídia. Em outros, como na Grã-Bretanha, a concentração do mercado é que traz prejuízos e o exemplo notório é o império midiático de Rupert Murdoch. Da mesma forma, segundo a iniciativa, países como Itália, Bulgária e Romênia experimentaram recentemente a perigosa superposição de interesses econômicos, políticos e midiáticos em uma só pessoa, empossada em cargo público.

Nesse contexto, a intenção da campanha é apresentar uma legislação supranacional que possa: 1) evitar a concentração de propriedade nos setores midiático e de entretenimento; 2) garantir a independência política da supervisão do conteúdo midiático; 3) definir como conflito de interesses e evitar a posse de cargos públicos por proprietários de midia; e 4) criar mecanismos de monitoração da estrutura midiática nos países do continente.

A iniciativa serve claramente de exemplo para o contexto brasileiro, inclusive latino-americano, como sugerido em uma publicação mais antiga deste Blog, sobre o relatório produzido pela organização Plataforma Democrática para o ambiente midiático na América Latina.

Afinal, as agências de comunicação dos governos da região, em geral, não conseguem desenvolver comunicação de perfil independente, não conquistam audiência e têm um custo muito alto para a sociedade. Da mesma forma, os conselhos e as agências regulatórias parecem não conseguir, nos países latino-americanos, conquistar posição autônoma em relação aos governos e partidos políticos ou mesmo às empresas. Ao mesmo tempo, as empresas acusam de antidemocrática qualquer intervenção no ambiente midiático, em geral escandalosamente concentrado, nas mãos de muitos políticos e poucas grandes corporações.

Em meio ao impasse, perde-se na região a referência do pluralismo, uma contribuição política importante do liberalismo, esquecida na interpretação economicista da ideologia, ao menos no Brasil. De fato, como sugere a pesquisa da Plataforma Democrática, o embate governo-empresa eterniza uma estrutura midiática perversa. É preciso, assim, que outros atores entrem no debate. Como já foi dito antes, em jogo está não somente a comunicação, mas realidade, existência e identidade social.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Interatividade zero

Relatório da ONU mostra que, mesmo utilizando as novas mídias, parlamentos insistem em se manter isolados do cidadão.

O Centro Global para a Tecnologia da Informação e Comunicação no Parlamento, órgão ligado à ONU, divulgou este mês (21/11/2012) o seu terceiro relatório sobre o uso de novas ferramentas digitais em casas de representação política ao redor do mundo. Com base nos dados de 156 parlamentos, incluindo o brasileiro, o texto mostra que o desenvolvimento de novas tecnologias de comunicação nesses espaços tem sido prioritariamente voltado para o acesso e divulgação de documentos e informação pelos parlamentares. Além disso, o relatório demonstra a baixa prioridade dada pela classe política às potencialidades de aproximação entre representantes e representados proporcionadas pelas novas mídias digitais.

A pesquisa foi produzida em torno de quatro perguntas feitas aos parlamentares, que deveriam responder ao menos três delas: 1) Quais são os três mais importantes benefícios gerados pelas novas tecnologias ao trabalho do parlamentar nos últimos dois anos?; 2) Quais as tecnologias introduzidas que puderam ajudar no aprimoramento do trabalho do parlamentar nos últimos dois anos?; 3) Quais são os mais importantes objetivos do parlamento no uso de novas tecnologias de comunicação e informação para os próximos dois anos?; e 4) Quais são os três maiores desafios do parlamento no uso mais eficiente de novas tecnologias de comunicação e informação?

No que diz respeito à primeira pergunta, sobre os benefícios gerados pelas novas tecnologias ao trabalho no parlamento, a resposta mais aferida, ressaltada por 54% dos entrevistados, foi "mais informação e documentos no website", seguida de "uma crescente capacidade de disseminar informação e documentos" (49%). Da mesma forma, em terceiro lugar foi ressaltada a possibilidade de "uma distribuição de informação e documentos aos membros mais eficiente em termos de tempo" (47%). Para a mesma questão, a resposta "mais interação com os cidadãos" aparece somente em sétimo lugar na lista, citada por apenas 23% dos entrevistados.

Sobre as mais importantes tecnologias instituídas nos últimos dois anos nos parlamentos, a "captura de áudio e vídeos dos procedimentos" aparece em primeiro lugar, ressaltada por 51% dos entrevistados. As mídias sociais como o Facebook e o Twitter foram citados por apenas 19% e "sistemas para gerenciar emails enviados por cidadãos aos parlamentares", por somente 5% dos entrevistados.

Com relação aos mais importantes objetivos no uso das novas tecnologias pelos parlamentos, a "crescente capacidade de disseminar informação e documentos" aparece em 46% das respostas; "uma distribuição mais rápida de informação e documentos aos representantes", em 45%; e "uma melhor organização dos documentos", em 43%. O objetivo de "interagir mais com os cidadãos" aparece somente em quinto lugar na lista, citado por 39% dos entrevistados (30% em parlamentos de países de baixa renda, 34% em parlamentos de países de renda média-baixa e 43% em parlamentos de países de renda média-alta e alta).

Finalmente, sobre os grandes desafios no uso eficiente das novas tecnologias pelos parlamentos são ressaltados "a inadequação dos recursos financeiros" (59%), "a inadequação dos funcionários" (47%) e a falta de conhecimento técnico pelos parlamentares (33%).

Apesar do tom otimista do relatório, que ressalta avanços gerados pelas novas tecnologias no que diz respeito à transparência das casas parlamentares, a pesquisa demonstra que um dos principais problemas dos regimes democráticos contemporâneos - o descolamento entre representantes e representados no dia a dia da política - não vem sendo tratado como prioridade pela classe política, que prefere se manter presa à lógica da comunicação de massa tradicional, onde falar é bem mais importante que ouvir. Nesse contexto, resta então à sociedade civil cobrar por desenvolvimentos mais efetivos no campo da interação, cujo potencial proporcionado pelas novas tecnologias não pode ser descartado.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

O conflito online no Oriente Médio

Israel e Hamas travam batalha de comunicação pelas redes sociais.

Na quarta-feira da semana passada, 14/11, exatamente às 16h21, o oficial israelense responsável pelo twitter das forças armadas do seu país postou na rede social uma foto de Ahmed Jabari, comandante do Hamas assassinado no mesmo dia pelo Exército de Israel. Além da proporção do ataque, que gerou o início formal da mais recente escalada da violência na região, a figura, com fundo vermelho e a estampa "eliminado" em destaque (veja ao lado), chamou a atenção da imprensa internacional.

Enviado para mais de 180 mil seguidores, o post se insere no conflito midiático entre Israel e o Hamas que se passa na internet, em especial nas redes sociais. Na mesma quarta-feira, antes do anúncio da morte de Jabari, as forças israelenses haviam postado, novamente no twitter, um aviso ameaçador: "Nós recomendamos que nenhum militante do Hamas, de baixo ou alto escalão, ponha seu rosto para fora nos próximos dias". Segundo o Haaretz, o vídeo do assassinato de Ahmed Jabari já foi visto mais de 3 milhões de vezes.

Especialista no Oriente Médio, o professor Johan Franzen chamou à atenção para "a emergência do tweet militar (military tweet)", em entrevista ao jornal britânico Eastern Daily Press. Segundo ele, as autoridades no Oriente Médio perceberam, com a Primavera Árabe, a necessidade de participar efetivamente das redes sociais de modo a contrabalançar a comunicação insurgente.

Nesse contexto, a ofensiva israelense no front apresenta um perfil mais amigável (e de gosto menos duvidoso) nas mensagens emitidas pelo Ministério das Relações Exteriores (MFA, Israel Ministry of Foreign Affairs). Apesar do título em destaque "Israel Under Fire", a página no Facebook da instituição, por exemplo, traz notícias sobre ações humanitárias de Israel em Gaza. Da mesma forma, o site do MFA tem uma seção de alto de página reservada à "situação humanitária" na região e um email foi enviado a todos os assinantes da newsletter do Ministério com informações e vídeos no You Tube sobre medidas desse tipo em território palestino. A estratégia de comunicação do MFA é desenvolvida pelo Twitter, Facebook e You Tube. Além disso, a instituição administra seu portal em quatro outras línguas além do hebraico, incluindo o árabe e o persa.

Do lado do Hamas, o Twitter das Brigadas de al-Qassan postou, por exemplo, o ataque israelense ao edifício na região Norte de Gaza. A ofensiva matou, como informou Marcelo Ninio, in loco pela Folha de São Paulo, 12 pessoas, incluindo quatro crianças e cinco mulheres. As Brigadas de al-Qassan, nome resumido para as Brigadas de Izz ad-Din al-Qassan, são o braço militar do Hamas, criado em 1992, em homenagem ao militante árabe que lutou contra ingleses e judeus durante o domínio britânico da Palestina.

Ainda na internet, o site oficial do Hamas e a página das Brigadas de al-Qassan, no entanto, se encontravam fora do ar no momento em que este texto estava sendo produzido. Além disso, as Brigadas não parecem ter uma comunicação organizada no Facebook. Uma hipótese é a de que as ações do Hamas nesse campo estejam sendo levadas à frente de forma mais caótica e espontânea pela militância árabe em todo o planeta.

Mesmo assim, é possível acompanhar a "versão palestina" da violência em Gaza pelo portal do Centro Palestino de Direitos Humanos. Segundo eles, 18 crianças foram mortas pelas forças israelenses nos últimos dias. O Centro está no Facebook, no Twitter e no You Tube. Neste último, entretanto, o último post foi publicado há dois meses.

A multiplicidade de vozes demonstra claramente a importância, talvez crescente, das ações de comunicação em conflitos políticos, ainda mais em situações extremadas como a que se desenvolve hoje, infelizmente, no Oriente Médio. Nesse contexto trágico, no entanto, a boa comunicação política exige um único centro emissor e profissionais formados na área.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

O mito da América dividida

Etnocentrismo político na cobertura das eleições nos Estados Unidos distorce preceitos básicos da política americana. 

Um dos mantras mais repetidos na cobertura sobre as eleições americanas, ao menos aqui no Brasil, é o de que os Estados Unidos seriam hoje "um país dividido", "uma nação partida". Nitidamente, percebe-se a reprodução de uma ideia de que atualmente haveria uma polarização excessiva no contexto político americano. A tese, entretanto, não se sustenta senão por um certo etnocentrismo político presente na narrativa midiática brasileira sobre o tema.

Em primeiro lugar, o pressuposto da divisão em geral advém de um número que pouco importa nas eleições americanas: a porcentagem sobre o total nacional de votos que cada um dos candidatos obteve. Chegou-se a prever, inclusive, como representação de uma polarização excessiva, a possibilidade de o republicano Mitt Romney ganhar nos votos da população, mas perder no Colégio Eleitoral.

Ora, esta mesma tese foi colocada na pauta em 2000, quando George W. Bush venceu o democrata Albert Gore no Colégio Eleitoral, mas perdeu na contagem dos votos populares. No entanto, um olhar mais cuidadoso sobre o mapa daquela eleição (Figura 1) dificilmente percebe algum tipo de divisão. Naquele momento, os democratas, apesar de contar com os grandes estados-eleitores Nova York e Califórnia, estavam basicamente restritos, com a exceção do Novo México, à Costa Oeste, à região dos Grandes Lagos e ao Nordeste dos Estados Unidos, com prejuízo para o partido em New Hampshire.

Figura 1
Mapa eleitoral das presidenciais de 2000
nos Estados Unidos



O predomínio claro republicano se repetiu em 2004, na disputa entre George W. Bush e John Kerry. O mapa do pleito daquele ano (Figura 2) foi ainda mais favorável aos conservadores, como se vê abaixo.

Figura 2
Mapa eleitoral das presidenciais de 2004
nos Estados Unidos

Ao se examinar o mapa da mesma eleição em 2004, mas por condado (Figura 3), a menor unidade geográfica da política americana, a inexistência de uma divisão acirrada naquele momento se torna ainda mais clara.

Figura 3
Mapa eleitoral por condado das presidenciais
de 2004 nos Estados Unidos


No mesmo sentido, o resultado de 2012 (Figura 4) não demonstra qualquer divisão, mas um predomínio democrata evidente nas áreas mais populosas do país e um avanço notório sobre estados que vinham sob domínio republicano, como é o caso de Ohio, Virgínia, Flórida, Novo México, Colorado e Nevada. Isso sem falar de Iowa, que foi dos republicanos em 2004, mas dos democratas em 2000, 2008 e 2012.


Figura 4
Mapa eleitoral das presidenciais
de 2012 nos Estados Unidos



Na verdade, o mapa de 2012 é, ao fim, bastante semelhante ao de 2008 (Figura 5), com mudanças apenas em Indiana e Carolina do Norte, absolutamente normais em se tratando do desgaste natural de um presidente em segundo mandato. Em 2008, Obama teve 365 votos no Colégio Eleitoral contra 173 de John McCain.

Figura 5
Mapa eleitoral das presidenciais
de 2008 nos Estados Unidos


De fato, nem mesmo as previsões mais sérias e cuidadosas para 2012 ressaltavam qualquer divisão. Poucos dias antes do pleito, Nate Silver, hoje uma das principais referências em estatísticas eleitorais nos Estados Unidos, publicou uma análise que dava a Obama mais de 90% de chance de vitória. Cruzando várias pesquisas para cada um dos estados da federação, Nate Silver previu uma vitória folgada do candidato democrata a partir do seu melhor posicionamento nos estados mais indefinidos, como Ohio, Virgínia, Iowa, Wisconsin, Colorado, Nevada, New Hampshire e até mesmo a Flórida. A vitória de Obama com uma diferença de quase 130 votos no Colégio Eleitoral (332 x 206) confirmou as previsões de Nate Silver. Além disso, os democratas ainda conseguiram retomar o controle do Senado, com 53 cadeiras, contra 45 dos republicanos e 2 independentes.

Dessa forma, aos partidários da divisão sobram os votos populares, 50% para Barack Obama e 48% para Mitt Romney, e o fato de que os republicanos mantiveram o controle sobre a Câmara dos Representantes, adquirido já nas últimas eleições de meio de mandato, em 2010. No entanto, é preciso inserir os números no contexto e na cultura política americana.

Com relação à contagem nacional dos votos, tal contabilidade escapa por completo da lógica federalista, que não é necessariamente antidemocrática. Na verdade, a opção pela federação, que torna cada um dos estados, inclusive, responsável por organizar seus próprios pleitos, obedece a lógica do "pertencimento voluntário", por meio do qual o sistema garante voz e peso às unidades federativas médias e pequenas em termos populacionais. Não à toa, muito se discute nas eleições americanas como se comportarão estados da importância de Wisconsin e Ohio.

Nesse contexto, o grande receio dos Pais Fundadores americanos era de que os desejos separatistas prevalecessem nos Estados Unidos, o que poderia levar o país a uma configuração próxima do que era a Europa antes da União Europeia: uma série de unidades independentes e soberanas constantemente em guerra. Acostumados com o centralismo da política brasileira, somos inclinados a dar excessiva importância à votação nacional - o que aqui caracterizo como um tipo de "etnocentrismo político" - e não levar em conta os benefícios e a estabilidade gerada pelo sistema (realmente) federativo.

No que diz respeito ao domínio republicano da Câmara dos Representantes, trata-se de mais um produto da Federação americana que, ao mesmo tempo em que propicia a União, incentiva a divisão do poder político, em benefício da liberdade e da proteção do cidadão contra os mandos do Estado. Afinal, o resultado na Câmara é dependente do que acontece nos condados. Hegemônicos em um maior número de condados de baixa densidade populacional, mas não no voto dos estados, os republicanos têm sua expressão política fruto deste resultado garantida pelo sistema.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A Crise dos Mísseis depois dos 13 dias

Arquivo de Segurança Nacional americano divulga documentos sobre as negociações entre soviéticos e cubanos após o acordo entre Washington e Moscou.

Documentos divulgados pelo Arquivo de Segurança Nacional americano mostram que a Crise dos Mísseis, que completou 50 anos no mês passado, esteve longe de terminar com o acordo fechado entre John F. Kennedy e Nikita Khrushchev, em 28 de outubro de 1962. Após o desfecho parcial, ainda faltava, ao menos para os soviéticos, negociar com Fidel Castro a retirada dos mísseis de Cuba e a manutenção do bom relacionamento entre o Kremlin e a ilha comunista.

Afinal, como conta o Arquivo, Fidel Castro não foi em momento algum consultado ou sequer informado sobre as negociações entre Moscou e Washington e enviou uma carta raivosa a Khrushchev quando soube, pela mídia americana, que o regime soviético havia aceitado retirar as armas nucleares de seu país. "Khrushchev sabia que tinha um problema em Cuba com a presença de 42 mil soldados soviéticos, armados com dispositivos tático-nucleares, e um líder revolucionário emotivo que se sentia traído e abandonado pelo Kremlin", escreveram Svetlana Savranskaya, Anna Melyakova e Amanda Conrad, no relatório que acompanha os documentos divulgados.

Ao mesmo tempo, era preciso explicar a decisão também para os oficiais soviéticos em Cuba, que haviam trabalhado dia e noite na preparação dos mísseis e chegaram à ilha dispostos a defender com suas vidas a revolução comunista no país. "Eles certamente ficaram surpresos com a mudança de atitude por parte de Moscou, que parecia abrir uma concessão atrás da outra sob pressão dos Estados Unidos", afirmam as autoras, no texto.

O encarregado de negociar com Fidel Castro e convencer os oficiais soviéticos em Cuba de que o Kremlin havia saído vitorioso da Crise dos Mísseis, o que o Arquivo de Segurança Nacional caracterizou como uma "missão impossível", foi Anastas Mikoyan, político comunista que já havia trabalhado para Lênin, Stalin e ainda trabalharia para Leonid Brezhnev. O filho dele, o historiador e editor russo Serge Mikoyan, foi quem reuniu os documentos, doados do Arquivo Mikoyan para o arquivo americano.

A "missão impossível" de Mikoyan constou de três desafios, impostos a ele por Khrushchev: negociar uma retirada lenta e discreta dos mísseis em Cuba, de modo que não provocasse os americanos, convencer Fidel Castro a aceitar as inspeções internacionais, que eram parte do acordo entre Moscou e Washington, e manter Cuba como um país aliado próximo do Kremlin, no intuito de garantir a legitimidade da liderança soviética frente ao movimento comunista.

Apesar das dificuldades, os documentos mostram que os objetivos foram alcançados basicamente com a insistência do negociador soviético em dois pontos principais. O primeiro foi o de que a segurança de Cuba e de sua revolução comunista estava garantida com os acordos firmados. Não havia mais espaço para uma nova Baía dos Porcos e isso foi exaltado por Mikoyan, tanto para o governo cubano como para os oficiais soviéticos na ilha, como uma grande vitória do Kremlin frente aos americanos. O segundo foi o de que as inspeções internacionais prometidas pelo Kremlin à Casa Branca fossem levadas à frente pelos embaixadores dos países latino americanos que já se encontravam como representantes no território cubano naquele momento.

Bem-sucedido, Mikoyan, no entanto, não perdeu também a chance de criticar a Operação Anadyr, nome do plano comunista de instalar mísseis nucleares em Cuba. "Os americanos lançaram seus U2s e descobriram que os mísseis estavam expostos horizontalmente como se estivessem em uma parada militar na Praça Vermelha. Somente na Praça Vermelha os mísseis ficam expostos dessa forma", afirma Mikoyan, nos documentos divulgados pelo Arquivo de Segurança Nacional e pela primeira vez acessíveis ao público.