sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Grã-Bretanha discute voto obrigatório

Ao contrário do que ocorre no Brasil, britânicos questionam voto facultativo.

A organização britânica Institute for Public Policy Research publicou este mês um artigo de três dos seus pesquisadores em defesa do voto obrigatório na Grã-Bretanha. Na verdade, como a reação à ideia de tornar compulsório o comparecimento às urnas é muito forte por lá – em geral os britânicos acham que obrigar o cidadão a votar é uma medida não democrática –, os autores optaram por fazer o que chamam de uma proposta "mais realista", ou seja, a de tornar o voto obrigatório somente para os jovens no primeiro pleito em que estiverem aptos a participar. Na Grã-Bretanha, a idade mínima para votar é 18 anos, mas os britânicos também estudam reduzí-la para 16 anos.

A ideia, que segue na contramão do que se debate no Brasil, tem por base não somente o fato de que o comparecimento às urnas tem decrescido na Grã-Bretanha, como em boa parte das democracias tradicionais que não utilizam o voto obrigatório, mas do crescimento exponencial do que o IPPR chama de "desigualdade no comparecimento". Como afirma um estudo publicado pela instituição no fim do ano passado, a participação eleitoral tem caído de forma drástica na Grã-Bretanha entre os jovens e os mais pobres.

Segundo a pesquisa, a diferença no comparecimento em 1987 entre o grupo mais rico e o mais pobre na Grã-Bretanha era de 4 pontos percentuais. Em 2010, essa diferença foi de 23 pontos percentuais. No que diz respeito à faixa etária dos eleitores, apenas 44% daqueles entre 18 e 24 anos votaram em 2010, enquanto 76% daqueles acima de 65 anos compareceram no mesmo pleito. O estudo do IPPR mostra que essa diferença, de 32 pontos percentuais em 2010, era de 18 pontos percentuais em 1970.

Para os pesquisadores, o problema da "desigualdade no comparecimento" é que ela reduz os incentivos para que os governantes respondam aos interesses daqueles que não votam, ameaçando um tema central da democracia, ou seja, o igualitarismo político eleitoral e sua capacidade de nulificar as diferenças de renda, status, conhecimento, educação ou qualquer outra distinção que ocorra entre os cidadãos na condução da política.

Nesse contexto, a ideia de promover algum tipo de comparecimento obrigatório tem a intenção de quebrar um ciclo vicioso. Afinal, a desigualdade no comparecimento tem levado os partidos britânicos a focar sua comunicação nos grupos mais dispostos a votar, que acabam por ter mais chance de ver seus interesses atendidos do que aqueles que não comparecem. Os ausentes, por sua vez, têm reforçado seu descontentamento com a política porque não veem suas vontades contempladas pela representação, o que gera mais insatisfação e reforça o desejo de não participar.

No Brasil, o comparecimento dos jovens às urnas também têm decrescido, já que o voto é opcional para aqueles entre 16 e 18 anos. Se eles foram 4% do eleitorado no pleito presidencial de 1989, em 1998 o índice foi de 1,78%. Em 2010, mesmo depois de intensa campanha do governo federal para que os mais jovens votassem, os eleitores dessa faixa etária contabilizaram somente 2,51% do eleitorado.

Na verdade, alguns estudos sugerem que a obrigatoriedade eleva em até 50 pontos percentuais o comparecimento eleitoral nos países que fazem tal opção. Sobre esse ponto, uma referência clássica é o caso da Venezuela, que modificou sua legislação em 1993, eliminando as penalidades aos faltosos. Após a mudança, a média de 90% caiu para níveis próximos a 60% de comparecimento.

2 comentários:

  1. Como sempre, amigo, muito interessantes seus artigos: este, em particular, usarei - com a devida referência de fonte, obviamente - em indicação aos alunos de Direito Constitucional, dentro da temática dos direitos fundamentais constitucionais de natureza eleitoral!

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    1. Rodrigo, obrigado pela leitura de sempre; um abraço, Arthur

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