quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Pluralismo, transparência e prestação de contas online podem mudar democracia brasileira

Depois de quatro dias de debates sobre internet e política na Casa do Saber, no Rio de Janeiro, a principal conclusão do curso foi a de que instituições virtuais específicas podem trazer amplos benefícios à democracia brasileira, em especial no que diz respeito ao pluralismo, à prestação de contas (accountability) e à transparência do Estado.

É claro, como foi discutido nos encontros, que a internet por si só não é necessariamente benéfica ou maléfica à democracia. Como foi visto, já é um consenso antigo da área o chamado "potencial vulnerável" da rede em relação ao aprimoramento democrático. Ou seja, tudo depende de efetiva "imaginação institucional", do grau e teor das iniciativas online.

No entanto, no que se refere aos "potenciais", estes são muitos. Afinal, os recursos comunicacionais da rede podem aumentar a transparência do Estado, aproximar o eleitor do representante político, potencializar a cobrança da sociedade, trazer novas formas de participação e deliberação à "esfera política"– para usar o termo clássico de Wilson Gomes –, facilitar a mobilização, equilibrar eleições e campanhas políticas e proporcionar um empoderamento relativo do cidadão nos processos decisórios. Além disso, e não menos importante, podem favorecer o pluralismo de agendas e enquadramentos no debate político.

Em termos mais gerais, uma das preocupações mais fortes da área aponta para a importâncias das iniciativas institucionais online como forma de resolver ou amenizar o documentado déficit de participação política que afeta as democracias liberais contemporâneas, como afirma novamente o professor Wilson Gomes no primeiro capítulo da obra Internet e participação política no Brasil, organizada pelo próprio, em conjunto com Rousiley Maia e Francisco Jamil Marques, e que preenche de forma importante um déficit de publicações em português sobre o tema.

No entanto, a questão do déficit de participação política não necessariamente deve ser pensada, em relação ao potencial da rede, apenas no sentido do aumento da participação direta e quicá do fim da representatividade, como foi muito comum na literatura da área nos anos 1990. Como afirma, novamente, Wilson Gomes, "há uma gigantesca diferença de dimensões e uma não menor diferença na complexidade dos problemas da vida pública que tornam inviável reproduzir as estruturas deliberativas e participativas da experiência comunitária antiga".

Nesse sentido, a idéia da participação política online não deve estar presa à utopia de um cidadão-total, devotado integralmente à participação política, nem mesmo à pretensão do fim dos regimes democráticos representativos, mas deve ser pensada como instrumento de redução do distanciamento entre o cidadão e o processo político decisório nas democracias modernas. Isso, vale reforçar, não significa necessariamente apenas o incremento da participação política direta, mas também, e principalmente, da pressão e da cobrança cidadã e da interlocução entre representantes e representados.

Com isso, a perspectiva de uma "democracia digital" se apresenta na forma de dispositivos, aplicativos e ferramentas digitais para "suplementar, reforçar ou corrigir aspectos das práticas políticas e sociais do Estado e dos cidadãos em benefício do teor democrático da comunidade política". Da mesma forma, "o fortalecimento, via tecnologias digitais, de instituições do governo representativo, destinadas a evitar que o sistema político, em geral, e os governos, em particular, apoderem-se do Estado em prejuízo da soberania popular pode ser um objetivo mais realista e eficiente do que a busca e a espera por participação civil maciça".

No caso específico da democracia brasileira, onde os princípios do liberalismo clássico são constantemente desafiados pela centralização decisória, falta de transparência, abuso da autoridade, desigualdade perante a lei e de oportunidades, e onde predomina um contexto comunicacional de massa aburdamente concentrado, temas como pluralismo, prestação de contas e transparência (no qual já contribuem, por exemplo, o Contas Abertas, a Transparência Brasil e a Lei de Transparência Nacional) de fato parecem mais relevantes de serem desenvolvidos institucionalmente no ambiente online do que a participação direta propriamente dita.

Para saber mais:

MAIA, R.C.M; GOMES, W.; MARQUES, F.P.J.A. Internet e participação política no Brasil. Porto Alegre, Editora Meridional/Sulina, 2011.

CHADWICK, A.; HOWARD, P.N. The Routledge Handbook of Internet Politics. Nova York, Routledge, 2010.

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