segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Em jogo, o poder de negociação de Barack Obama

A vitória histórica dos republicanos nas eleições de meio de mandato deste ano traz uma nova dificuldade para o governo Barack Obama nos Estados Unidos. Como se não bastasse um cenário econômico desolador – o crescimento em taxa anualizada de 2% do PIB anunciado em 29 de outubro para o terceiro trimestre deste ano é, segundo a Economist, suficiente apenas para evitar o crescimento do desemprego no país e não melhora a vida dos 8 milhões de trabalhadores que perderam seus postos durante a última recessão –, Obama terá que lidar a partir de janeiro de 2011 com uma ampla maioria republicana na Câmara dos Representantes, bem como com um país majoritariamente comandado por governadores do Grand Old Party (GOP).

Mesmo que a tendência normal é de que a primeira eleição de meio de mandato seja desfavorável ao incumbente – explicada pelo fato de que as muitas expectativas lançadas na eleição dificilmente são contempladas –, a vitória republicana alcançou resultados históricos. Com a ajuda da mobilização levada à frente pelo movimento tea-party, os republicanos angariaram pelo menos 60 cadeiras na Câmara dos Representantes (alguns resultados ainda estão indefinidos em função de recontagens), o que dá ao partido a sua maior representação na Casa desde 1940. Os democratas tinham 255 representantes na Câmara antes da eleição, agora têm 186. Os republicanos tinham antes 178. Agora, 239. Além disso, a importante maioria democrata no Senado perdeu pelo menos seis assentos. Agora são 53 democratas contra 46 republicanos (um assento ainda está indefinido e pode ficar nas mãos dos republicanos). No âmbito dos estados, os democratas governam agora 17, e os republicanos, 29 (um governador é independente e em três estados o resultados das últimas eleições ainda não foi definido).

O balanço geral do pleito assume uma conotação ainda mais negativa frente à tendência jeffersoniana de Barack Obama de priorizar a agenda doméstica em detrimento de ambições internacionais, já discutida em outro post. Na ocasião, escrevi, seguindo a análise de Walter Russell Mead: "Jeffersonianos, como Barack Obama, são partidários da vida simples, de governos sem grandes pretensões. Não gostam das máquinas públicas de guerra, de intervenções exageradas e muitos compromissos internacionais. Acham que a melhor política externa dos Estados Unidos é servir como exemplo para outras nações, construindo uma vida social justa, pacífica e livre. Os camponeses de A vila, de M. Night Shyamalan, são jeffersonianos típicos. Bem como foi a luta de Mark Twain contra a ocupação americana das Filipinas no final do século XIX, muito bem retratada em seu livro Patriotas e Traidores, publicado no Brasil pela Fundação Perseu Abramo".

Nessa situação, presidentes têm basicamente duas opções, ainda mais em cenários de crise e na intenção (e sob pressão) de implementar reformas: buscar pautas consensuais e fazer acordos em questões possíveis atrás do apoio de adversários moderados ou acusar o partido adversário de criar um impasse no governo, de usar a (precária) situação do país em prol de benefícios políticos próprios. No primeiro caso, há o risco de se descontentar o eleitorado próprio. No segundo, o eleitorado em geral pode interpretar o posicionamento do presidente como descaso ao que foi decidido no voto. Em 1994, Bill Clinton conseguiu negociar com um Congresso de maioria republicana, mas o ex-presidente não enfrentou uma maioria tão ampla e um movimento conservador em efervecência como o tea-party, que certamente irá patrulhar as ações de republicanos mais moderados no Congresso. Além disso, são conhecidas as excepcionais credenciais de Clinton como negociador.

Nesse contexto, pesa o fato de que várias decisões sobre o orçamento do governo americano terão que ser tomadas nos próximos meses. Uma oposição republicana ferrenha pode significar mais dificuldades para o governo Obama implementar novas medidas de estímulo à economia como forma de recuperação da crise recente. Obama tem tentado a fórmula clássica keynesiana à la Roosevelt com o intuito de retomar o ritmo de crescimento, em detrimento do enorme déficit fiscal. Segundo muitos republicanos, as políticas não têm demonstrado efeito e, para uma boa parte do partido, está na hora de conter os gastos e apostar mais na iniciativa privada.

O problema para os republicanos e o que pesa a favor de Obama é que o partido não está unido sobre como seguir em frente depois da vitória acachapante nas eleições de meio de mandato. Boa parte das análises afirmam que a liderança mais experiente republicana teme que a postura dos mais radicais acabe prejudicando o partido nas eleições de 2012, com propostas como a extinção de certas agências do governo e o endurecimentos contra os imigrantes ilegais e ampla resistência em relação aos debates sobre meio ambiente e o casamento gay. Provavelmente, essa divisão ficará ainda mais clara quando tiver início o processo de escolha do partido para as presidenciais de 2014.

2 comentários:

  1. Em meio ao barulho em casa, Obama vai às vendas na Asia. Tomara que não seja tarde.
    Alexandre.

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  2. São fatos certamente interligados, Alexandre, e você faz bem em conectá-los. Estratégia usual de criar um novo fato político imediatamente após uma derrota e de deslocar a atenção para o plano internacional quando a situação em casa não está das melhores. Não à toa o anúncio do apoio de Washington à entrada da Índia como membro permanente no CS. A reunião do G20 promete. Um abraço e obrigado pelo comentário.

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