sexta-feira, 9 de abril de 2010

O Estado, o Rio de Janeiro e as chuvas

Dois problemas da política nacional que se agravam no Rio de Janeiro estão por trás da tragédia desta semana no estado: as prioridades anacrônicas da agenda política brasileira e a concentração no processo de constituição da linguagem política no Brasil.

A questão da agenda é simples: a pauta é muito tomada pelas grandes questões econômicas. Talvez por conta de uma tradição de instabilidade teoricamente já superada, somada a uma outra nacionalista, que rege as grandes questões da nação, a política brasileira parece muitas vezes presa a determinados temas: taxa de juros, inflação, desenvolvimento, a indústria brasileira, a balança comercial. Além disso, são os problemas da corrupção (desvio econômico) e as tramas internas às alianças e aos conflitos políticos.

Questões básicas como educação, saúde, segurança, acesso à justiça, habitação, saneamento, cidadania são pautas para os cadernos especiais da mídia política brasileira, ou surgem em meio às tragédias.

As contas do governo federal brasileiro, tanto no período de FHC quanto de Lula, são bastante representativas desse modelo. Entre 1995 e 2004, segundo um estudo feito no Congresso, quatro grandes contas englobaram os gastos de Brasília: juros da dívida pública, aposentadorias, salário da burocracia e custo da máquina pública (todos os gastos com exceção dos vencimentos). Os juros absorveram 727 bilhões de reais. Os salários, 1,07 trilhão de reais. A aposentadoria, 1,2 trilhão. O custo da máquina, que não funciona, 2,78 trilhões.

A soma chega a 5,78 trilhões, seis vezes mais que os 884 bilhões investidos em educação, saúde, segurança ou qualquer outro investimento desse tipo no mesmo período. Entre 1995 e 2004, o orçamento federal dedicou 0.49% para a segurança, 5.85% para a saúde, 6.67% para a educação.

E a tendência se mantém. Um estudo encomendado pela Folha e publicado em abril de 2009 mostrou que entre abril de 2006 e fevereiro de 2009, os gastos federais com os salários da burocracia cresceram 40 bilhões de reais e o custo da máquina, 26,7 bilhões de reais. No mesmo período, investimentos federais reunidos em educação, saúde, segurança etc. aumentaram em 14,7 bilhões. Na atual política, para alguns política midiatizada, estar fora da pauta significa menos recurso.

No caso do Rio de Janeiro, a situação é ainda mais grave. Com uma concentração brutal da comunicação midiática no estado e na cidade do Rio de Janeiro, ou seja, concentração no processo de construção da linguagem política na região, cariocas e fluminenses perdem com o empobrecimento de seu pensamento político e, como não poderia deixar de ser, de sua própria realidade. Não à toa, São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul dominam hoje a política brasileira.

Um comentário:

  1. Uma análise brutalmente singela, profunda e inequivocamente precisa sobre a realidade política-orçamentária do País, há muito tempo (e tempo demais)!!!

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